Os anos restam-nos desde a primeira vez e quando soar a hora da partida nada mais haverá que partilhar. Seremos qualquer coisa insidiosa. Qualquer coisa esboroando-se rente à simplicidade, algum pão acompanhando um vinho barato. Sobre a mesa jazem copos acicatando os corpos. Algumas cadeiras vagas, nada que possa já resgatar-nos ao cansaço.
Este é o intenso lugar onde nossos caminhos se bifurcam.
O céu como uma pintura de William Turner, um breve estudo sobre a cor e a luz. Poderíamos ter ficado na contemplação deste céu sobre Lisboa, teimando que só a arte nos pode salvar as vidas.
Há contudo vozes que nos chamam, uma ponte unindo ambas as margens. É essa ponte que nos grita a necessidade de partirmos. Arranjamos então uma desculpa e assim corremos céleres rumo à infelicidade.
Esta tenebrosa ânsia, a procura de um sentido onde ele não se faz. Percorreríamos linhas rectas, treinaríamos alguns exercícios de geometria. Contudo, o auge é sempre algures, entre o início e o fim. A acme. A partir daqui já não é possível o retrocesso e a excepção é um longo caminho, sempre em frente.
Não estamos adequados a viver o absurdo. Esse é o anátema que nos tropeça. Deixamos que a trama da razão nos erija o mundo e nada é mais longe que esta estúpida procura pela verdade.
Os dias são longos como gelo e as horas o limite da corrida.
Fotografia: António Caeiro
Texto: Rui Carvalho