Translate

domingo, 20 de outubro de 2019

De Rerum Natura - XI - Fotografia: Paula Santo António; Texto: Rui Carvalho


Não é possível sabermos como a vida eclodiu, mas é provável que no início de tudo tenha havido uma mistura entre um lugar mais perto e um outro lugar mais longe. Talvez o lugar mais perto aconteça no epicentro de um coração e o lugar mais longe ande sempre em deriva. 
Ao olharmos para muito longe sentimos uma energia em crescendo. Quando a energia cresce rondamos o acontecer das coisas. É no interior dessa energia que ocorremos como forças. 
Tudo se trata de colisões, da repetição de vários choques em cadeia. Na colisão entre duas ou mais forças há sempre duas possibilidades que se geram: o encontro e o desencontro.  
O humano. 
Somos qualquer coisa entre a atracção e a repleção, uma quase infinda série de espaços vazios que se completam. Ou não.
De qualquer modo, talvez as cores possam voar. Talvez no decurso do voo possam as cores trazer um lugar até um outro. Talvez após dois lugares se haverem reconhecido haja sempre um novo mundo a ocorrer. 
Fotografia: Paula Santo António
Texto: Rui Carvalho

domingo, 30 de junho de 2019

De Rerum Natura - IX - Fotografia: Paula Santo António; Texto: Rui Carvalho




Construí-o passo a passo, um lugar dentro da solidez. Fui do berço até à queda. É a queda que nos interrompe o chão. O chão interrompido vibra-nos o escorço das paisagens. As paisagens chamam-nos ao mundo e o mundo chama-nos ao chão. Há um momento, um instante irrompendo os lugares. Os instantes irrompem os lugares e os lugares depõem-nos face a face. Face a face com o mundo pomos os pés em algo sólido. Na solidez das coisas, os passos são estacados até ao espanto. O espanto sopra o sopro, um vento levantando-se com as cores. Quando as cores são ouvidas a paisagem torna-se outra.  
 Fui eu que quis esta solidão, o estranho lugar até aos pássaros dançando.

 De ouvidos rente ao solo, assim te aguardarei na nudez, os lugares inexprimíveis. Tu, dançando as cores do mundo.  

Fotografia: Paula Santo António
Texto: Rui Carvalho

sexta-feira, 24 de maio de 2019

De Rerum Natura VIII - Fotografia: Paula Santo António; Texto: Rui Carvalho


       Vamos guiados pelo metal em nossos bolsos até ao ruído das coisas. Vagos de sentido, dirigimo-nos a lugar nenhum. Acordamos entre a neblina, num esconderijo bem guardado. De quando em vez deparamo-nos com a “insignificância”, uma qualquer pedra transpondo em si muitos milénios. 
  É esse o segredo, importarmo-nos com coisas que aos outros nada importam. 
Este é o sopro adensando-nos os lugares, a breve névoa que nos fixa. 
  Acho que volto a saber quem és: uma fé vinda de longe, da distante ilha onde Teseu se perdeu no abandono.

        Fotografia: Paula Santo António
        Texto: Rui Carvalho 

      

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

De Rerum Natura - VII - Fotografia: Paula Santo António; Texto: Rui Carvalho



Construímos labirintos para neles nos prendermos. Julgamos sentir-nos mais seguros desse modo. Com a vontade aferroada pelos dias tornamo-nos idênticos às paisagens. Excepto quando o fogo arde. A identidade das chamas é um lugar quase impossível. 
Conheço de cor toda esta estória. Desde Dédalo e Ícaro que sonho este lugar: duas asas de cera e uma trajectória até ao sol. Os dias correm de soslaio enquanto avanço no teu riso.
Sigo guiado pelo espanto, todas as cores exaladas no teu cheiro. 
Adquiro-me na fragilidade da espera. 
Aqui aguardo o brilho dos teus olhos, a luz escorrendo até meu peito. 

Fotografia: Paula Santo António
Texto: Rui Carvalho