Translate

domingo, 23 de dezembro de 2018

De Rerum Natura - VI - Fotografia: Paula Santo António; Texto: Rui Carvalho



Tudo se inicia na alma. Sim, também o incêndio dos corpos. Os olhos são o início da estrada. 
Por enquanto tudo é deserto. 
É imprescindível que saibamos ganhar lastro para avançarmos mar adentro. Percorrendo lugares desconhecidos adquiriremos a coragem da queda. 
O desnudamento é uma arte difícil. Poucos conseguem alcançar a magia das coisas. Convém ser preciso nos passos, no modo como nos dirigimos ao que verdadeiramente importa. 
Desenhar-te-ei o rosto a partir dos teus olhos. Após o teu rosto, sonharei teu corpo. Não tenho pressa de chegar a ti. Conhecendo de cor o sol saberei de cor as tuas ondas. 

Quando as rochas alcançam o barulho do mar todos os mundos se revelam possíveis. 


Fotografia: Paula Santo António
Texto: Rui Carvalho

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

De Rerum Natura - V - Fotografia: Paula Santo António; Texto: Rui Carvalho



Os loucos acampam rente ao mar. Como se estivéssemos nos primeiros dias de verão, os loucos vão chegando cedo. As praias estão ainda desertas e eles já lá estão, sentados. Os loucos erguem tendas em redor das paisagens, sentam-se frente a frente com o impossível. Mais tarde, quando as pessoas chegarem, os loucos adormecerão. Sem que ninguém saiba que adormeceram farão o sol chegar. A canícula ecoará nas paisagens e depois fará ricochete. Convém que as portas fechem rápido, de modo a que do incêndio só nos fique o calor.
Enquanto dormem os loucos sonham. Dentro dos seus sonhos há lugares repletos. As paisagens serão alagadas e nós estaremos lá, seremos alagados pela preciosidade do tempo. Nada se dá da mesma maneira porque tudo se mistura. 
Até que a depuração nos alcance serão necessários muitos rombos, inúmeras noites em branco resolvendo as formas do mundo. 
Estas são as águas, este é o fogo que as move.

Fotografia: Paula Santo António
Texto: Rui Carvalho