Tudo é moldável, inclusive a matéria.
E.
Há um dia em que acordamos outros. Puxamos então de longe o que um dia fomos e é essa força que nos gasta. Os ossos entram-nos por dentro da carne e as horas rasgam-se até os dias serem outros também. Assim entramos no labirinto, desconhecendo qualquer saída, qualquer rasgo que nos possa valer uma vida.
Por cima de nós há o céu e por baixo, por baixo há uma bola de fogo. Habitamos a zona intermédia das coisas, é isso. É isso que nos dá esta ilusão de segurança. Somos seguros pelos corrimões e achamos que assim será para sempre.
Há contudo um dia em que acordamos outros.
As mãos escorregam-nos no fogo e os meus olhos desvelam-se-me em ti. É por aí, é por essa fresta que a luz entra, é por aí que o mundo ocorre. O sopro do mundo voar-nos-á sobre o labirinto, e Creta, Creta é um lugar lindo quando se espelha nos teus olhos.
Fotografia: Céu Baptista
Texto: Rui Carvalho